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Sabado, 22 de Marco de 2025

Crônicas

Não limitem a curiosidade dos seus bebês e ajudem a formar indivíduos mais criativos, questionadores e livres

Notei que ele ficou imóvel por alguns segundos, como se estivesse processando uma informação ultraimportante.

Água Preta News
Por Água Preta News
Não limitem a curiosidade dos seus bebês e ajudem a formar indivíduos mais criativos, questionadores e livres
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*Crônica de Edelvânio Pinheiro

No domingo de Carnaval, enquanto a folia se espalhava pelas ruas em um redemoinho de cores, batuques e serpentinas, Eben, meu pequeno explorador de sete meses, dedicava-se a uma investigação minuciosa no chão da sala de casa. Nada de trio elétrico nem confetes. Eu dava sequência à leitura de Mulheres que correm com os lobos, de Clarissa Pinkola Estés, da editora Rocco, e passei a observar aquela cena. O olhar curioso do bebê se fixava no pé do sofá, algo que, para qualquer adulto, passaria despercebido. Ali, naquele momento, eu testemunhava um dos fenômenos mais fascinantes da infância, que é a descoberta do mundo através dos sentidos.

Notei que ele ficou imóvel por alguns segundos, como se estivesse processando uma informação ultraimportante. Em seguida, inclinava-se levemente, examinando cada detalhe daquela estrutura como um velho sábio diante de um enigma da natureza. A madeira maciça, a inclinação dos pés frontais, a verticalidade dos pés traseiros… Tudo parecia digno de um estudo profundo. Para Eben, aquilo não era apenas um móvel; era um universo a ser explorado, cheio de texturas, formas e possibilidades.

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Eben ainda não fala, mas os sons que já emite e sua linguagem corporal dizem muito. Seus dedinhos tateavam a superfície da madeira como quem busca compreender os mistérios do mundo. Talvez ele tenha se perguntado por que aquele pé era diferente dos que sustentavam a parte de trás do sofá. Talvez tenha notado que a madeira, ao contrário do plástico e do metal vistos nas cadeiras e no armário da cozinha, trazia uma textura mais viva e convidativa. Para ele, aquela exploração não era apenas um passatempo; era uma aula prática sobre física, design e até mesmo arte.

O que nós, adultos, chamamos de "detalhes", para os bebês são grandes descobertas. Aos sete meses, os pequenos estão em pleno desenvolvimento da percepção visual e tátil. Eles treinam suas habilidades motoras finas e exploram o ambiente com uma atenção que, ironicamente, muitos de nós perdemos com o tempo. Nesse período, a curiosidade não tem limites, e tudo – absolutamente tudo – é um evento digno de encantamento. Cada objeto, cada som, cada textura é uma oportunidade de aprendizado. E é justamente essa exploração que os ajuda a construir conexões neurais, a desenvolver a inteligência e a compreender o mundo ao seu redor.

Eben seguiu sua análise por longos minutos, até que, em um súbito gesto de decisão, levou a boca ao pezinho do sofá. Fiquei observando aquilo, sem fazer qualquer objeção, afinal, a ciência exige experimentação! Esse ato, que para muitos pode parecer banal ou até mesmo preocupante, é, na verdade, uma etapa fundamental do desenvolvimento infantil. A boca é um dos primeiros instrumentos de investigação que os bebês possuem. Através dela, eles descobrem texturas, temperaturas, sabores e consistências. É como se o mundo precisasse ser "provado" para ser compreendido.

E foi aí que eu entendi tudo. Enquanto os foliões corriam atrás do trio elétrico, ele já tinha encontrado o Bloco da Descoberta, onde cada textura, cada ângulo, cada cheiro e sabor fazem parte de uma festa tão fascinante quanto o carnaval. Para Eben, aquele momento era uma celebração do conhecimento, uma dança de neurônios em formação, uma festa de sinapses que se conectavam a cada nova descoberta.

Talvez ele tenha chegado a uma conclusão brilhante, uma tese revolucionária sobre a importância do design na estabilidade dos móveis. Mas, como ainda não aprendeu a falar, guardou para si essa descoberta. Resta a mim esperar pacientemente, na esperança de que um dia ele me revele o segredo do pé do sofá.

E a mensagem que quero deixar para os futuros pais é que eles permitam que seus bebês explorem. Criem um ambiente seguro, mas não limitem a curiosidade deles. Cada toque, cada olhar, cada experimentação é um passo em direção à autonomia e à inteligência. Os bebês são cientistas natos, e o mundo é o laboratório deles. Quando deixamos que explorem livremente, estamos incentivando o desenvolvimento cognitivo e ajudando a formar indivíduos mais criativos, questionadores e, acima de tudo, livres.

Então, da próxima vez que você vir seu filho examinando minuciosamente alguma coisa ou levando à boca um objeto aparentemente insignificante, lembre-se que ele está fazendo muito mais do que brincar. Ele está aprendendo, descobrindo e construindo as bases para uma mente brilhante e inquisitiva. E isso, caros pais, é a verdadeira magia da infância.

 

*Edelvânio Pinheiro é bacharel em Jornalismo pela Católica (UCA) e licenciado em Letras Vernáculas pela UNEB. É também pós-graduado em Ciências Políticas, radialista e autor de sete obras, incluindo crônicas, livro-reportagem e literatura infantojuvenil.

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