A saúde pública de Itanhém vive uma sucessão de episódios vergonhosos e desumanos. Na manhã desta sexta-feira (3), a trabalhadora rural Silvana Carvalho da Silva, de 32 anos, grávida de 13 semanas e 7 dias, com histórico de aborto espontâneo, pressão alta e hérnia no estômago, relatou ter sido destratada e humilhada pelo motorista de uma ambulância da Prefeitura Municipal de Itanhém.
Silvana já havia enfrentado complicações graves na gestação. Na semana passada, sofreu descolamento de placenta e sangramento, o que torna a gravidez de alto risco. Moradora de Ibirajá, distrito que amarga quatro meses sem médico, ela precisou acionar a ambulância após fortes dores na barriga. No entanto, em vez de acolhimento, recebeu ofensas, gritos e tratamento indigno, segundo ela.
“Eu só queria que ele me tratasse como gente. Eu não sou lixo, não sou cachorro dele. Estou com a placenta descolada, não posso passar raiva nem andar nessa ambulância sacolejando nos buracos, porque é perigoso eu perder meu neném”, desabafou Silvana, quando já estava no hospital, na cidade de Itanhém, ao ser procurada pela reportagem do Água Preta News. Antes disso, porém, ela já havia gravado um vídeo no entroncamento que liga Ibirajá a BA-290, que circulou nas redes sociais, relatando o exato momento em que se recusou seguir na ambulância. Depois, em razão das fortes dores que estava sentindo, decidiu continuar a viagem.
Segundo ela, o motorista da ambulância, identificado como Luiz Carlos Verly, chegou à porta de sua casa de forma agressiva, depois de haver recusado a buscá-la, afirmando que não tinha “a obrigação” de pegar pacientes em casa. Durante o trajeto, Silvana afirmou ter sido sacudida com violência nos buracos da sua rua, caindo sobre outras pessoas que estavam no veículo. No vídeo gravado dentro do automóvel, é possível perceber os passageiros sendo sacudidos durante o trajeto e ver um homem segurando seu enteado para não bater a cabeça na lateral do carro.
“Parece que ele estava carregando porco dentro da ambulância”, disse, abalada.
Silvana revelou que foi a primeira vez que precisou viajar na ambulância conduzida por Luiz Carlos, mas ressaltou que já havia escutado relatos semelhantes.
“Uma mulher, Margarete, gravou e postou nos status que ele tratou ela como lixo. Já tem umas quatro, cinco pessoas no grupo dizendo que ele tratou elas do mesmo jeito. Eu não sou a primeira”, afirmou.
Enquanto conversava com a reportagem, a gestante estava dentro da sala de emergência do Hospital Municipal, aguardando atendimento. Sua mãe, também com problemas de saúde, que se deslocou para Itanhém na mesma ambulância, permanecia esperando consulta médica.
O caso não passou despercebido pela Câmara Municipal. O vereador Gelson Picoli, representante de Ibirajá, já relatou episódios semelhantes de destrato desse motorista com moradores do distrito e, ao ser procurado pela reportagem, prometeu levar o ocorrido com Silvana novamente à tribuna na próxima sessão legislativa.
Este é o terceiro fato grave envolvendo a saúde de Itanhém durante esta semana, todos denunciados pelo Água Preta News:
Banheiro em condições precárias foi registrado em vídeo dentro do Hospital Municipal. Clique aqui para ver.
Morador de Vila Resende com clavícula quebrada foi mandado para casa sem cirurgia há 20 dias, gerando revolta da família. Clique aqui para ver.
Agora, uma gestante em situação de risco denuncia maus-tratos dentro de uma ambulância do município.
Esses casos não são isolados. Eles revelam uma sequência de falhas estruturais, de descaso e de falta de comando na saúde pública municipal.
Todos esses fatos têm um ponto em comum: a responsabilidade direta do prefeito Bentivi, do PSB, que se mantém inerte diante do colapso da saúde pública no município. A precariedade do hospital, a ausência de médicos em distritos e postos de saúde, a falta de cirurgias e agora a humilhação de uma mulher grávida dentro de uma ambulância são reflexos de uma gestão que falha no que deveria ser sua prioridade, cuidar da vida das pessoas.
Nesta semana, o Água Preta News publicou um editorial contundente, lembrando que “Saúde não é favor, é direito. E direito se cumpre”. A cada novo episódio, a frase ganha ainda mais atualidade e força.
Enquanto o prefeito Bentivi, sua mulher secretária e seus apoiadores diretos se ocupam de inaugurações e propaganda, a população de Itanhém sofre com banheiros inadequados no hospital, pacientes sem cirurgia e uma mulheres com gravidez de risco sendo “tratada como lixo” dentro de ambulância.
Silvana, que trabalha pegando café, como tantas outras mulheres humildes do campo, apenas queria ser atendida com respeito. Seu desabafo expressa a indignação de milhares de itanheenses que se sentem abandonados pelo poder público.
“A política de agora tá feia lá [em Ibirajá]. Quatro meses sem médico. E ainda tem que passar por uma humilhação dessa pra ir pro hospital”, lamentou.
Até o fechamento desta reportagem, às 16h48, Silvana, que chegou ao hospital por volta das 10h30, ainda aguardava para realizar um ultrassom para avaliar o estado do feto e a evolução da sua gravidez de risco.
Água Preta News
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