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Domingo, 20 de Abril de 2025

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Do impresso ao digital, lembrei de Elane, do Big Brother, e do jornal A Tarde

Houve um tempo em que o jornal impresso, depois da televisão, era o principal meio de informação.

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Por Água Preta News
Do impresso ao digital, lembrei de Elane, do Big Brother, e do jornal A Tarde
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Organizando minha biblioteca na nova casa, deparei-me com uma obra que instigou lembranças e reflexões profundas sobre minha trajetória no jornalismo impresso: O destino do jornal, de Lourival Sant’Anna. Esse livro, publicado em 2008, analisa a crise do jornalismo impresso em um contexto de massificação da internet e mudanças nos hábitos de leitura, abordando questões que, ao longo dos 29 anos da minha carreira, vivi na prática como correspondente, editor e proprietário de jornal. A leitura dessa obra me levou a revisitar memórias e a refletir sobre os desafios e as transformações que marcaram a profissão que escolhi.

Houve um tempo em que o jornal impresso, depois da televisão, era o principal meio de informação. Nas capitais, nas primeiras horas da manhã, leitores corriam às bancas para adquirir a edição do dia. Nas cidades do interior, como no caso de Itanhém, no início da noite, após a chegada do último ônibus, os assinantes aguardavam ansiosos a entrega de seu exemplar. Era uma rotina quase sagrada para muitos leitores. A informação era literalmente palpável. A tinta da impressão às vezes sujava as mãos, as laudas de papel eram preenchidas à máquina de escrever por jornalistas atentos ao compromisso com a notícia, e as fotografias eram reveladas em papel, compondo páginas que registravam a história em tempo real. Esse ritual diário de consumo de notícias era um reflexo de uma época em que o jornalismo impresso era sinônimo de credibilidade e profundidade.

Minha trajetória nesse universo começou em 1996. Fui proprietário do Jornal Impacto, em Itanhém, e editor do Alerta, um dos maiores jornais do extremo sul da Bahia. Posteriormente, tornei-me correspondente do A Tarde, de Salvador, atuando na sucursal do extremo sul, sob a chefia de José Anchieta. Essa experiência me permitiu cobrir fatos marcantes da região e testemunhar a evolução do jornalismo em diferentes contextos. Trabalhar como correspondente foi especialmente desafiador, pois exigia apuração dos fatos com maior precisão e a tradução de uma realidade local para um público mais amplo, mantendo a essência das histórias.

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Lembro-me, por exemplo, de uma das reportagens que assinei na edição nº 30.596 do A Tarde, em 14 de janeiro de 2003. A matéria tratava da participação da professora Elane Silva Chaves, de Itanhém, no Big Brother Brasil. Ela alcançou o segundo lugar na terceira edição do reality show, enquanto o assessor parlamentar Dhomini Ferreira levava o prêmio de meio milhão de reais com 51% dos votos. Esse foi um dos muitos textos em que tive a oportunidade de documentar acontecimentos de impacto na nossa região. Cobrir eventos como esse me fez perceber o poder do jornalismo em conectar histórias locais a um contexto nacional, ampliando o alcance e a relevância das narrativas.

A leitura de O destino do jornal me remete ao desafio que atravessamos com a chegada da era digital. Lourival Sant’Anna, hoje na CNN, identifica três fatores estruturais que moldaram essa transição: o acirramento da concorrência, a mudança nos hábitos de leitura e a inovação tecnológica. Se antes o jornal era a principal fonte de informação escrita, hoje disputa espaço com redes sociais, portais noticiosos e a instantaneidade dos aplicativos de mensagens. A tradicional lauda de papel deu lugar ao bloco de notas digital, a fotografia impressa cedeu espaço às imagens instantaneamente compartilhadas. A velocidade com que as notícias circulam hoje é impressionante, mas também traz consigo desafios, como a superficialidade e a desinformação.

No entanto, isso não significa o fim do jornalismo, no meu ponto de vista. A sobrevivência do jornalismo está na sua capacidade de se reinventar, mantendo o compromisso com a verdade e a profundidade da informação. O papel pode ter perdido espaço, mas o jornalismo de qualidade permanece essencial, especialmente em tempos de desinformação. Acredito que o jornalismo continua tendo um papel importante na sociedade: o de investigar, contextualizar e oferecer análises que vão além dos 280 caracteres de um tweet ou da superficialidade de um post nas redes sociais. A credibilidade construída ao longo de décadas pelos veículos tradicionais é um patrimônio que não pode ser subestimado.

Olhando para trás, sinto orgulho de ter vivido a era do impresso, de ter segurado laudas rabiscadas, de ter visto fotografias ganhando vida em papel, de ter feito parte da história do jornalismo regional e nacional. E, olhando para frente, vejo que o desafio continua, na necessidade de se adaptar, sem perder a essência. Como bem pontua Lourival Sant’Anna, o jornalismo não tem um destino traçado, mas sim uma trajetória em constante transformação. Acredito que o futuro do jornalismo está na convergência entre o tradicional e o digital, na capacidade de contar histórias de forma envolvente e relevante, independentemente do suporte.

A experiência de organizar minha biblioteca e reencontrar O destino do jornal foi um exercício de reflexão sobre o passado, o presente e o futuro da profissão que escolhi. Ainda que os tempos tenham mudado, a essência do jornalismo — a busca pela verdade, o compromisso com a informação e a responsabilidade de informar — permanece mais importante do que nunca. E é nisso que continuo acreditando.

 

FONTE/CRÉDITOS: Por Edelvânio Pinheiro
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